Versos Íntimos
Texto de autoria de Elias Daher, colunista da coluna LiterArte de setembro de 2016 a junho de 2017
Augusto dos Anjos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
Comentários
Soneto considerado um dos cem melhores do século XX.
Aqui, o autor exerce a plenitude da liberdade, em uma época conservadora, demonstrou a coragem de abordar extremos para demonstrar a relação do homem com o mundo. Muitas vezes, comparável às reações das feras selvagens.
Texto ousado porque exerce a interlocução com uma hipótese… com quem é que o autor conversa?
Na segunda estrofe o autor aborda a resignação “Acostuma-te à lama que te espera!”
Predominam ironias e provocações, no melhor estilo de Augusto dos Anjos. Parece ter sido concebido com o firme propósito de escandalizar.